quinta-feira, 3 de abril de 2014

funções da crítica jornalística



“A critica costuma ser considerada um gênero literário. Mas talvez seja mais 

adequado classifica-la como gênero literário-jornalístico, porque a critica, 

como a conhecemos desde o século XIX, quando as primeiras apareceram, 

em geral pelas mãos de romancistas, como José de Alencar e Machado de 

Assis, esteve vinculada de maneira estreita ao jornalismo. Criticas são 

escritas para serem publicadas em jornais, suplementos e revistas. Por isso, 

consideramos-las textos diferenciados no corpo do jornal; não são noticias ou 

reportagens, cujo objetivo imediato é informar o leitor sobre um 

acontecimento qualquer, mas um texto informativo-opinativo, que abusa da 

função expressiva da linguagem com o objetivo de atrair o leitor para a obra 

artística e refere-se a um acontecimento específico.” (GARCIA, 2004 p. 71).


Fonte: GARCIA, Maria Cecília. Reflexões sobre a critica teatral nos jornais: Décio de Almeida Prado e o problema da apreciação da obra artística no jornalismo cultural. São Paulo: Ed. Mackenzie, 2004.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Sobre Vida, da Companhia Brasileira de Teatro



Vida (BH, 2010): a primeira impressão foi um estranhamento completo: antes do início da cena, uma música incidental que é emitida ao vivo, por um trompete, e preenche o espaço cênico, que é iluminado e no qual um ator entra e disserta, de forma crua, direta e ágil, como um conferencista, sobre as infinidades de possibilidades de acontecimentos do mundo a partir do jogo retórico... o ator Rodrigo dizia e se desdizia:

- Quem brilha? (pausa) foneticamente, a pergunta é uma modulação ascendente, na emissão da frase. Perceberam? Quem brilha? Eu pergunto. Se eu pergunto e vocês me respondem, alguém me responde, podemos começar o diálogo.[1]



A partir deste início, notei que o texto jogava simultaneamente como significante e significado das palavras, ou seja, com a parte sonora e de sentido das mesmas, gerando uma atenção do espectador [e em mim, é logico], que acompanha o discurso contínuo e desenfreado do ator. E não posso deixar de notar o tom interrogativo que instaurava um jogo direto com o espectador. 

Não há neste momento nenhuma interferência sonora em áudio ou instrumental e o texto dito me envolve, como uma música, e me perco um pouco sobre os sentidos do assunto que ele aborda com precisão. 

Sei que este ator fala sobre o lugar das pessoas no mundo e das múltiplas alternativas da vida, mas seu discurso não me prende em um único sentido, ao contrário abre-se para um voo de imagens e impressões. Permanece ali a oralidade de suas palavras, que me soam como uma composição sonora rítmica, cheia de saltos no espaço, com curvas e ondulações e uma sensação de cores brilhantes, no qual o significante surge como uma materialidade concreta, que me leva para um passeio de carrossel enfeitado e alegre. Aos poucos, mais dois atores entram em cena: uma mulher e um homem se juntam ao primeiro, e um jogo de línguas começa aos poucos a se instaurar, pois a atriz dizia, em francês, o texto dito pelo ator. Ali pude identificar um primeiro jogo entre som e cena que desejava explorar. Porém, algo irônico e pessimista, quase trágico, estava escondido atrás daquela vertigem discursiva, aparentemente inocente. 

Essa primeira cena preparou minha atenção para o que ia acontecer em seguida: uma banda tocando ao vivo. O ritmo fervoroso e rápido do texto dito pelo ator desaparece e, em seu lugar, surge o constrangimento do silêncio dos atores, que se preparam para tocar. Bumbo, pratos e uma canção com a letra em russo, preenchendo todo espaço, com uma composição pomposa e grandiosa. Eles começam a música, mas um deles fracassa, o conferencista do início, erra continuamente. E é a partir desse impasse, desse vazio, dessa contínua interrupção que o espetáculo é agenciado. A música, aparentemente lúdica e leve, em tons festivos, que evoca um acontecimento cívico, permanece como um refrão durante todo o espetáculo e esconde as tragédias cotidianas de cada sujeito, que narra em cada quadro, suas impressões. E por ai vai, imagens, fracassos, idas e vindas de depoimentos...

Vida e a Companhia Brasileira de Teatro: algumas referências

A Companhia Brasileira de Teatro nasceu em 2000, em Curitiba, formada pelas atrizes Giovana Soar e Nadja Naira e pelo Diretor e Dramaturgo Márcio Abreu, recebendo como parceiros os atores Rodrigo Ferrarini e Ranieri Gonzalez. O grupo foi criado por profissionais desejosos por desenvolver processos de pesquisa na área teatral, inspirados pela força poética de autores como Julio Cortázar, Paulo Leminski e Gonçalo Tavares. Buscam elementos de comunicação direta com o público através da fala prosaica do cotidiano e do diálogo com a música instrumental tocada ao vivo por músicos convidados e pelos próprios atores. O grupo mantém um intenso ritmo de produção e parcerias com artistas teatrais franceses como Thomas Quilladert, com quem realizaram o espetáculo bilíngüe Distraits, nous vaincrons, em Paris, 2010, e que foi uma ação que integrou a criação de Vida. Além da parceria que desenvolveu com os grupos Espanca de BH e Grupo XIX de SP durante dois anos, este ano ganharam o prêmio da Revista Bravo, que resultou na estreia do espetáculo Oxygenio. Em 2011, entreia de Isso te interessa?, e em 2012, Esta criança, com Renata Sorrah.

Vida, que teve forte inspiração da poesia de Paulo Leminski, foi concebido num processo que durou um ano e meio, e contou com diversas oficinas e workshops, abertura de sua sede e diversos ensaios e experimentos para o público da cidade de Curitiba. A atuação se apropriou dos poemas de Leminski, de maneira pessoal, legando à cena, um tom confessional, e instaurando um jogo entre representação e linguagem perfomática, que apesar de não propor uma relação de intervenção direta com o espectador, convida a este a participar do jogo de questionamentos e dos momentos de silêncio que surgem rompendo um momento de tensão ou intensificando um momento trágico ou de constrangimento. 

Quem quer conhecer o grupo e mais sobre o espetáculo Vida, acesse:




[1] ABREU, Márcio. Vida, p. 1.