terça-feira, 29 de agosto de 2017

Privê até que ponto?

Quando saio para assistir um espetáculo, nunca crio expectativas de um grande show de talentos e de atuação, tampouco vislumbro uma virtuosidade nas atrizes e atores. Para mim, teatro é lugar de compartilhamento e de aprendizado: ninguém está nem vai ficar pronto. Parafraseando Belchior “absorver e sentir as coisas me interessa mais”. Dito isso, gostaria de compartilhar minha experiência assistindo “Lugar de Fala: Suíte Nº 5”, experimento de conclusão da disciplina do curso de Artes Cênicas da Universidade Federal de Ouro Preto, Interpretação IV, ministrada pela professora e mestra Raquel Castro.
O espetáculo - que tem como linha de pesquisa a mimesis e que também é dirigido por Raquel - surpreende. Logo de cara, uma sala aparentemente normal; pessoas, TV, sofá – imagem facilmente linkada a de uma família. Ali, vários discursos se cruzam e se chocam. Até que ponto os “memes” da internet são só “memes”? Qual a linha tênue entre discurso de ódio, opinião e opressão? São essas as indagações que as atrizes e atores trazem, todos expostos aos olhares do público curioso.
“Lugar de Fala: Suíte Nº 5” - foto de Théo Mantelato

Encenado no espaço das Moradias Estudantis Universitárias daqui da UFOP, o exercício/espetáculo se apropria dos vidros do prédio e de seus espaços comunitários (até a cozinha comunitária vira palco). O espaço redondo, permite que o público circunde o espaço e se depare com outros personagens. Os personagens foram escolhidos pelas atrizes e atores, segundo indicação da diretora.
“Lugar de Fala: Suíte Nº 5” - foto de Théo Mantelato

Sabe Black Mirror? Então...

“Lugar de Fala: Suíte Nº 5” - foto de Théo Mantelato


O exercício/espetáculo foi apresentado uma única vez e conta com a interpretação de Lívia Maria, Lisandra Paixão, Jaqueline Pinheiro, Diego Abegão, Gustavo Faria, Yago Rufato e Pedro Gaban.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Teatro é Morte. Morte também é Vida.



Não é de hoje que se fala sobre a relação entre arte e vida. O teatro, onde corpos vivos de atores dão forma e movimento às histórias que ficariam estáticas - estátuas perdidas num deserto, existência que não se vê e não produz sentido - se não fossem lidas ou representadas, é muitas vezes visto como uma das artes em que essa aproximação fica mais evidente. Como reflexo de sua efemeridade, o teatro é tido como metáfora da vida. Esquecemos, no entanto, que em sua essência, tanto o teatro quanto a vida são fundamentalmente efêmeros, prenúncio do blackout que precede o cair dos panos. “Cai o Pano” (Curtain) é o nome do livro da Agatha Christie em que nos despedimos do detetive Poirot e ele se despede da própria vida. Poderíamos nos perder em infinitas associações entre o fim de um espetáculo teatral, o descer das cortinas e o anoitecer gelado de quando o coração cessa de pulsar. Maria Alice Vergueiro (São Paulo - 1935), no entanto, nos oferece uma superação da morte em vida ao encenar seu velório em “Why The Horse”, e é a partir dessa obra que ampliaremos nossa percepção sobre as sutis linha entre o real e o ficcional; o concreto e o abstrato; a encenação e a experiência; a morte-vida e a arte.

Em uma atmosfera onírica e de sensações surrealistas, o espetáculo (denominado como um happening em entrevista de vídeo com a atriz) oferece camadas de sentido que entrelaçam o tema da morte (bem como os sinais de perecimento presentes na fragilidade do corpo envelhecido) com um panorama da carreira de Maria Alice nas artes cênicas. Referências diretas a autores e obras interpretados pela atriz, além de trechos de textos e canções que tangenciam o existir e deixar de existir, compõem quadros que se conectam com ações, iluminação e figurino que revelam um imaginário mais bem humorado do que fúnebre sobre o assunto.

A composição principal do palco inclui um piano à esquerda; um fundo de lápides verticais ao centro, com nomes importantes para o teatro, como Stanislavski, Tchekhov, Svoboda, Sarah Kane, Boal, Cocteau, entre outros, além de um nome que não pode ser lido devido a um jarro de flores colocado à sua frente (o nome Maria, talvez?); uma cadeira de rodas; também há elementos que são colocados e às vezes retirados de cena. As maiores transformações que acontecem nesta composição, no entanto, ocorrem devido às interferências das movimentações dos atores e da iluminação, que alterna entre uma geral chapada e branca e entre colorações azuladas e arroxeadas, além da penumbra.

Após o pianista (que executa grande parte da trilha sonora ao vivo) começar a tocar uma música fúnebre, Maria Alice Vergueiro entra em cena, denunciando toda a fragilidade de seu corpo ao ser amparada por dois companheiros que irão contracenar com ela. Luciano Chirolli, parceiro de outros trabalhos, é quem ajeita os joelhos da atriz para que esta se mantenha em pé enquanto atravessa o palco e faz vênias às lápides e à plateia, anunciando: “Obrigada por vocês virem ao meu velório.”. Em seguida, ela é levada até a cadeira de rodas, onde abraça Luciano para se sentar. Eles se olham com cumplicidade e ela começa a cantar o poema de Brecht, “Ó delícia de começar”. Outras referências sobre obras ou atores memoráveis da carreira da atriz geralmente são anunciadas (assim como diversos tipos de quebra são bastante comuns ao longo do espetáculo) e nomes como Beckett, Brecht e Weill são constantes.

Trilha musical; efeitos sonoros; iluminação; figurino (Luciano veste um terno poído, sob o qual traz o peito coberto por bandagens); a presença de uma criatura que poderia ser a morte, vestida com um casaco de folhas e que tem função caótica na dinâmica das ações; leve ao tratar da sexualidade depois dos 60; os relatos da própria atriz, como a afirmação de que não consegue lembrar de um poema que irá recitar e vai precisar do auxílio de sua parceira de cena como ponto; e o tão enigmático cavalo do título são apenas alguns dos elementos que se misturam para criar este universo dramático que se configura quase como um portal que não está localizado nem neste mundo nem no outro, mas delicadamente pousado na interseção entre eles.



FICHA TÉCNICA:
(referência: http://spcultura.prefeitura.sp.gov.br/evento/24357/)

Grupo Pândega

Direção – Maria Alice Vergueiro

Assistente de Direção – Pedro Monticelli

Dramaturgia – Fábio Furtado

Direção de Movimento – Alexandre Magno

Elenco – Maria Alice Vergueiro, Luciano Chirolli, Carolina Splendore, Robson Catalunha, Alexandre Magno e Otávio Ortega

Cenário – J.C. Serroni. Figurino –Telumi Hellen

Desenho de Luz – Guilherme Bonfanti

Trilha Sonora Original – Otávio Ortega

Direção de Produção e Administação – Carla Estefan

Direção de Cena– Elisete Jeremias.Camareira – Maria Cícera

Design Gráfico – Sato – Casadalapa

Operação de Luz – Marcela Katzin

Operação de som – Fabrício Cardeal



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



AMORIM, P. F. Em 'Why the Horse?', Maria Alice Vergueiro encena a própria morte, 2017. Disponivel em: <http://www.huffpostbrasil.com/paloma-franca-amorim/em-why-the-horse-maria-alice-vergueiro-encena-a-propria-mort_a_21676446/>.

MARIA Alice Vergueiro não tem medo da morte. Instituto Hilda Hilst. Disponivel em: <https://www.hildahilst.com.br/blog/maria-alice-vergueiro-nao-tem-medo-da-morte>.

VÌDEO do You Tube. Why the horse - legendado. YouTube. Disponivel em: <https://www.youtube.com/watch?v=ecy7HfSQ328>

sábado, 26 de agosto de 2017

Dorotéia Farsa Irresponsável de Nelson Rodrigues Na Visão De Jorge Farjalla

O espetáculo Dorotéia dirigido por Jorge Farjalla a partir do texto de Nelson Rodrigues. Traz como protagonista da peça a atriz Rosamaria Murtinho e Letícia Espiller no elenco, além dessas atrizes que marcam a divulgação do espetáculo que acaba ganhando um peso de ser Global. Temos a presença das atrizes, Anna Machado, Dida Camero, Jaqueline Farias e Aleixa Deschamps, uma mistura que sustenta o espetáculo. A Proposta do senário traz uma inovação nas cores e formas utilizadas nessa montagem, comparado a outros espetáculos recém montados de Doroteia. Segundo o diretor Jorge Farjalla: o senário e figurinos não seguem as rubricas da peça de Nelson Rodrigues. Além dessa mudança também surge os “Homens Jarros” criação do diretor.
A peça foi escrita por Nelson Rodrigues em 1949. Conta a história da personagem Doroteia que acaba de perder seu filho e decide bater na porta da casa de Dona Flávia, Maura e Carmelita. A moça Doroteia diz ser prima delas. Acontece que as mulheres dessa família são herdeiras de dois sintomas: o primeiro é que não podem ver homens e o segundo todas sentem náuseas após a primeira relação sexual.



O espetáculo da início com um senário organizado para um teatro de arena, mesmo em um palco italiano o diretor tem a preocupação de disponibilizar alguns lugares em volta do palco para que o público se acomode. O que me incomodou foi a forma como essas pessoas foram direcionadas para esses acentos. Depois que toda a plateia se acomodou nas poltronas o espetáculo iniciou e algumas pessoas ainda estavam sendo deslocadas ao redor do palco sujando a cena que já estava acontecendo. Não sei se esse ocorrido aconteceu apenas quando eu assisti. Além disso acredito que a partir do momento que eu estou preste a assisti um trabalho tudo ao meu redor deve ser observado.
  O que mais me chamou atenção do cenário foi as gigantescas arvores colocadas em volta do palco de onde saiam as músicas presentes durante o espetáculo. Das arvores também saiam algumas vezes os Homens Jarros figuras masculinas que circulavam pelas cenas algumas vezes tocando instrumentos outra apenas jogando com os personagens.
Fiquei pensando no formato padrão dos corpos masculinos colocados em cena, todos os atores músicos possuíam físicos bem desenhados e esculturais. Isso talvez não seja resultado da indústria da imagem vendida na mídia? Bom se é ou não é era atraente para a plateia observar esses corpos desfilando pelas cenas. O conjunto de cenário e figurinos que mais lembravam capas de sofá dos anos 70 deram um tom lúdico para o espetáculo. As vozes das atrizes contavam com um sistema que provocavam um eco criando uma atmosfera que lembrava um ambiente pesado como um “Umbral” lugar onde ficam as almas perdidas entre o céu e a terra.  
Dorotéia interpretada por Leticia Spiller que deixou a desejar com sua atuação que em muitos momentos parecia que estava sendo interpretada para uma câmera de TV. Não senti entrega nem força cênica da atriz com a personagem. Apesar dos figurinos e maquiagem serem maravilhosos a atriz deixou por desejar, mesmo assim sua presença era esperada pela plateia que em diversos momentos vibrava quando Leticia Spiller entrava em cena. Isso me causou uma frustação em pensar que muitas das vezes as cassas cheias não são por causa da boa peça e atuação dos atores e sim por conta de uma imagem vendida.
As cenas eram resolvidas de forma inteligente, teve momentos que pareciam jogos de palhaços como a hora que a filha de dona Flavia interpretada por Rosamaria Murtinho   das Dores, personagem que na peça de Nelson Rodrigues havia nascido morta do ventre de sua mãe e cresceu sem saber de seu falecimento. No momento que dona Flavia revela para das Dores que ela nasceu morta das Dores volta para o ventre da mãe para nascer novamente. A cena é resolvida da seguinte forma: a atriz caminha até dona Flavia que está sentada em uma cadeira que fica coberta pela sua saia, nesse momento a personagem das Dores passa por debaixo da cadeira enquanto dona Flavia grita. Forma simples de resolução no momento me pareceu mal trabalhada. Achei um pouco dramático de mais, e lembrei dos jogos de palhaços que muitas das vezes são simples e exagerados.
No todo o espetáculo é interessante tem momentos que aparecem algumas críticas feita por Nelson Rodriguem ao escrever Doroteia. Críticas que falam sobre o padrão de beleza que a sociedade impõem, da mediocridade da família burguesa. Tudo isso o diretor e os atores conseguem chegar em alguns momentos, mais ainda sinto falta de uma interpretação mais entregue isso talvez tenha impedido Dortéia de Jorge Farjalla de receber mais aplausos.    

Ficha Técnica:

Texto: Dorotéia
Autor: Nelson Rodrigues
Diretor: Jorge Farjalla
Assistente de Direção: Diogo pasquim
Elenco: Rasamaria Murtinho, Letícia Spiller, Alexia Drdchamps, Dida Camero, Anna  Machado e Jaqueline Farias.
Homens Jarros (músicos): Fernando Gajo, Pablo Vares, André Américo, Du Machado, Daniel Veiga e Rafael Kalil
Cenógrafo: Zé Dias
Figurino: Lulu Areal
Direção Musical: JP Mendonça
Direção de produção: Bruna Petit
Produção executiva: Sandra Valverde
Produção operacional: Lu Klein




sexta-feira, 25 de agosto de 2017

50 Anos de uma Arte Viva

Cuidados de Amor foi é uma peça escrita e dirigida por José Luiz Ribeiro para o Grupo Divulgação, em Juiz de Fora. Na trama, Isaac acaba de perder a sua mulher, veem em uma de contratar uma pessoa para cuidar de pai. Entretanto, colocam duas irmãs gemias como cuidadoras. Maria Santa e Santinha são interpretadas por Márcia Fallabella. Mal sabem eles que essas irmãs escondem alguns segredos. Diante de tantas intrigas, brigas e alfinetadas entre irmãos, irmãos brigam para decidir o futuro do pai eles se esquecem do que é mais importante que é o pai. O pai fica à mercê das duas irmãs gemias que começam a enlouquecer o Isaac e a trama acaba de forma catastrófica para o personagem de José Luiz Ribeiro.  
cenografia é baseada em portas de madeiras onde podem perfeitamente transformar o espaço cênico de maneira rápida e harmoniosa. Existe também um pequeno sofá e um quadro, esse determinado criando uma ambientação de uma sala é onde se passa boa parte da trama. Quando esse cenário se fecha o espetáculo fica mais sombrio, de forma que, grande parte dos acontecimentos catastróficos acontecem com ele fechado.   
Imagens tiradas do site do Grupo Divulgação: http://www.grupodivulgacao.com.br/repertorio/2014-cuidados-de-amor.php

Podemos ver a relação das duas estruturas de cena nas fotos a cima, dessa forma podemos ver a efetividade da cenografia e da iluminação. Existe na iluminação que conversa com todos os elementos colocados em cena, unindo o ator, a cenografia e o espaço cênico. A luz está presente de forma simbólica assim como os elementos colocados em cena, como o quadro que representa a cidade pequena.  
O viés político do Divulgação está presente também nesse espetáculo, tratando de maneira cômica e dramáticas os maus tratos e o abandono dos idosos. Outro aspecto interessante proposto também pelo grupo, é o projeto escola espectador que é desenvolvido a mais de vinte e cinco anos que leva jovens de diferentes idades das redes públicas de ensino para assistir os espetáculos de forma gratuita. No início de cada espetáculo é distribuído um formulário para que os espectadores possam expressar o que sentiram ao ver o espetáculo, esse formulário ajuda no desenvolvimento do trabalho do grupo e do trabalho que está sendo feito.  
O Divulgação com o seu espetáculo coloca à tona aspectos importantes para os dias atuais, mostrando que um grupo de teatro que tem mais de cinquenta anos de história pode sim desenvolver um espetáculo atual e que converse com seus espectadores jovens. 
FICHA TÉCNICA
Autor: José Luiz Ribeiro
Ano: 2014
Elenco: José Luiz (Isaac), Fátima Amorim (Tais), Victor Dousseau/ Walmor Machado (Marcos), Michell Costa (Matheus), Marina Metri (Joana), Márcia Falabella (Santa Maria e Maria Santa).
Programa sonoro e gravação de trilha: Jocemar de Souza 
Sonotécnica: Carina Salgado
Iluminotécnica: Bárbara Borges
Cartaz: Franciane Lúcia
Fotos: Jesualdo Castro
Registro videográfico: Andréia Oliveira
Figurino: Malu Ribeiro
Cenário, desenho de luz, trilha sonora e direção: José Luiz Ribeiro
Referência: 
http://www.grupodivulgacao.com.br/repertorio/2014-cuidados-de-amor.php